A gente quase completou um ano de namoro, quase. Faltou
um mês ou um pouquinho mais, não lembro. Mas hoje, sem mais nem menos,
completamos um ano de separação. Ano passado essa hora, exatamente a essa hora,
eu lembro bem. Eu estava no show do U2 que você não quis ir comigo e me ocupava
em perguntar, de dez em dez segundos, e de dez em dez pessoas, quando é que você
iria me ligar e dizer que tinha pensado melhor. Quando? Você nunca ligou,
nunquinha. E eu esperei, esperei, esperei tanto tempo, nossa, como eu esperei.
Acho que eu nunca esperei tanto nada em toda a minha vida. Outro dia a Myla me
perguntou o que você tinha me ensinado. A gente estava conversando sobre os
legados que as pessoas deixam em nossas vidas e ela quis saber qual tinha sido
o seu [...] posso dizer que foi você quem me ensinou a lição mais importante da
minha vida: você me ensinou a sofrer. Eu nunca, nunca, nesses anos de vida,
tinha sofrido. Nunca.
Mas quando você,
me mandou seguir meu caminho sozinha, fiquei sem saber como fugir da dor. Você
era meu príncipe. Depois de tantos amores estranhos, pequenos, errados e
tortos, finalmente eu tinha reconhecido no seu olhar centralizado e no seu
sorriso espalhado, o meu príncipe. E o meu príncipe estava me dando o fora. Que
porra eu ia esperar da vida agora? Quem iria me levar para longe se você não me
queria mais por perto? Não teve como. Foi a primeira vez na vida que não
consegui me enrolar e acabei deixando a dor vencer. Pela primeira vez a realidade
falou mais alto que a fantasia. Pela primeira vez a realidade da sua ausência
falou mais alto que a fantasia de anos a sua espera. Sofri pra caralho, como
diz por aí quem sofre pra caralho. Mais do que livros cabeças, músicas bacanas,
frases inteligentes, lugares descolados ou posições sexuais, você me ensinou o
que realmente importa aprender nessa vida: que a vida pode ser uma grande,
imensa e gigantesca merda. É, ela pode ser. E que não existe porra de príncipe
porra nenhuma. Que nem ninguém e nem nada pode te levar para longe de nada. É
isso e pronto. E é assim pra todo mundo. E pronto. Qual o drama? A dor infinita
dos dias infinitos que vieram depois do dia em que você se foi pra sempre veio
misturada com toda a dor que eu não senti em todos esses anos.
A dor do seu pé na bunda trouxe tardes perdidas em odiar
o mundo, cabeças viradas, corredores frios, papéis de parede beges e grupinhos
festivos e fechados. A nossa dor acabou sendo toda a dor que fazia fila em mim
para ser sentida. Mas agora já passa da meia noite. Não é mais nosso
aniversário de fim e, pra te falar a verdade, eu já não sofro mais o nosso fim
faz tempo. E pra te falar ainda mais a verdade, eu acho mesmo que você foi o
príncipe que eu esperei a vida inteira. Você chegou e me levou embora. Levou
embora a menina que tinha medo de sentir a vida e esperava uma salvação para
tudo. Quem sobrou é essa desconhecida que se conhece muito bem em suas
bizarrices, lê jornais todos os dias, substituiu o bege pela cor do verão, tem
uns pais gente boa ainda que malucos, adora os poucos e estranhos amigos, não
espera mais pelo cavalo branco mas fica ansiosa pelo início da novela e talvez
esteja pronta para amar de verdade. Amar um homem e não um príncipe.
Tati Bernardi
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